ROMA E JERUSALÉM: NA PERSPECTIVA DE UN MESTRE
Por Antonio Carlos Coelho
Jornal Universidade Ciência e Fé (Brasil)
Año 13. No. 151 - Julio 2012
Há uma longa história de conflitos ainda a ser superada. As relações entre a Igreja Católica, Israel e o povo judeu melhoram muito, principalmente após o Concílio Vaticano II, mas restam resquícios a serem superados. Será preciso mais do que um diálogo religioso. É sobre este assunto que Julian Schvindlerman, autor de “ROMA Y JERUSALEM: la política vaticana hacia el estado judio”, editado pela Debate (Argentina), falou recentemente em Curitiba. Julian veio a Curitiba com o apoio do Fundo Comunitário da Comunidade Israelita do Paraná. Conversou com estudantes e professores da Universidade Positivo e, também, com os membros da comunidade judaica do Paraná.
Julian é licenciado em administração pela Universidade de Buenos Aires e mestre em Ciências Sociais pela Universidade Hebraica de Jerusalém. Ensina no Centro de Estudos de Religião, Estado e Sociedade do Seminário Rabínico Latino-americano Marshall T. Meyer, em Buenos Aires. É colunista do periódico Comunidades e da Rádio Jai. Além de Roma y Jerusalem escreveu “Tierras por Paz, Tierras por Guerra” (Ensayos del Sud: 2002), assim como os ensaios, “Introducción al Nuevo Antisemitismo” (Edição Bnai Brith 2010) e “El Otro Eje del Mal: antinorteamericanismo, antiisraelismo y antisemitismo” (Milá: 2004).
Conversei com Julian antes da sua conferência no Centro Israelita do Paraná. Foi uma conversa rápida para um assunto tão longo e complexo. Impressiona a imparcialidade de Julian. Fala com isenção de um tema polêmico e que envolve profundamente o sentimento judaico.
Comecei perguntando sobre o quanto o diálogo religioso entre o judaísmo e o catolicismo tinha contribuído para melhor entendimento entre os dois povos. O professor respondeu que muito havia contribuído. Que o Concílio Vaticano II deu um passo gigantesco para a aproximação de judeus e cristãos no mundo. No entanto, só o diálogo estabelecido com base na religião, nos textos comuns aos dois grupos – a Bíblia – no rever a questão da Shoá – nos pedidos de perdão da Igreja pelos séculos de perseguição e preconceito – não abrangiam a totalidade do diálogo.
Para dialogar com judeus é preciso reconhecer que judaísmo é mais do que uma religião. A identidade judaica não é fragmentada. Contempla o conceito de nação, de terra e de fé num único Deus. E é com o judaísmo, em sua integralidade, que o diálogo deve ser realizado.
Professor Julian chama a atenção pelos 45 anos que separam a criação do novo Estado de Israel do reconhecimento oficial pelo Vaticano, marcado pela instalação da embaixada do Vaticano em Israel. Recorda de que a Igreja já havia passado pela experiência de não possuir um estado independente, o que só foi possível após o Acordo de Laterano, em 1929. Portanto, uma experiência que poderia ter sensibilizado a Igreja aos objetivos judaicos. No entanto, segundo Julian, a Igreja, antes de reconhecer a criação do Estado de Israel considerou considerar as possíveis reações do mundo islâmico. Nos países árabes existem comunidades cristãs de diversas denominações que poderiam sofrer com tal reconhecimento. O reconhecimento só foi efetivado após o Acordo de Oslo, em setembro de 1993 e, também, quando Israel passou a ser atacada por mísseis do Iraque, na Guerra do Golfo. Estes dois fatos teriam dado uma abertura para que o Vaticano – um estado com preocupações políticas, como qualquer outro- reconhecesse o Estado de Israel.
Julian lembra que sempre houve um diálogo diplomático entre os dois estados. Prova disso é a excelente convivência entre Israel e as comunidades católicas no país. As propriedades são respeitadas, não há agressões aos cristãos, por parte dos judeus, em Israel, bem como as datas religiosas são guardadas pelos católicos e cristãos orientais com respeito. Milhares de cristãos visitam Israel todos os anos e jamais sofreram qualquer tipo de embaraço por parte das autoridades ou por parte da população judaica. Há em Israel um grande número de escolas e instituições religiosas que funcionam regularmente. Muitas delas foram estabelecidas há muitos séculos no país.
Para Julian Schvindlerman, o grande complicador dessas relações não se situa no âmbito da diplomacia de estados. Estas relações são tratadas como em qualquer outra situação política. A dificuldade está mais no âmbito religioso e moral do que no político. O Vaticano, por ser um estado católico, onde o Papa é o seu soberano, possui uma carga de compromissos de ordem moral. Torna-se extremamente difícil separar as questões políticas, próprias de um estado soberano, das questões de ordem moral. Isto ocorre também com o povo judeu. É um povo que nasceu e foi desenhado por uma ética monoteísta que serve de base ao mundo ocidental. Isto impõe ao judeu uma carga de responsabilidade imensa e que lhe é cobrada a cada ação, mesmo que esta seja em favor de sua defesa e sobrevivência. Isto, muitas vezes, não lhe permitida, dado ao forte sentimento antissemita – hoje chamado de antissionismo – que persiste no mundo.
Julian, em sua conferência, bem como em seu livro, fez uma retrospectiva das relações entre judeus e católicos. Destacou o papel dos últimos dois papas nas relações judaico-católicas e Vaticano – Israel. Chamou a atenção aos gestos positivos do Papa João XXIII durante o Concílio Vaticano II. Valorizou a fidelidade – que caracterizou, também, como algo pessoal – do Papa João Paulo II na relação com judeus, aos erros da história, aos perdidos na Shoá. Lembrou as posições de Bento XVI, sempre coerentes com os atos de seu antecessor no trato com o judaísmo.
Julian, não deixou de lembrar o controverso silêncio do Papa Pio XII em relação à perseguição e morte dos judeus durante o nazismo. A questão não está bem clara, afirma o professor. Como, também, não se pode, ainda, afirmar ter sido Pio XII o autor da ordem para abertura dos conventos com fins de oferecer proteção aos judeus. Sabe-se que o fato aconteceu, todavia, não está esclarecido se por ordem do Papa ou se foi uma iniciativa dos religiosos. Este é um ponto da história não resolvido entre o Vaticano e o povo judeu e que causa reflexos nas relações em a Igreja, o Estado de Israel e o povo judeu.